Perfil do blog

Este blog pretende ser uma espécie de coletânea de vídeos, links, fatos, notícias, imagens, textos (escritos ou não por mim) sobre os temas cultura e meio ambiente. A opção pela junção de tais temas se deu na medida em que ambos são para mim de primaz interesse. Um outro aspecto que fundamentou tal procedimento é o fato de que a cultura de um povo resulta do modo como este povo se relaciona com o meio em que vive. Sendo que um país - tal como o Brasil - possuindo vários tipos de paisagens, possuirá diferentes tipos de culturas e se caracterizará pela somatória de todas.

Tentarei fazer uma seleção de abordagens que contribua para a ampliação da compreensão dos temas e forneça elementos para posicionamentos mais condizentes frente a eles. Com isso, o intuito será somar esforços com todos aqueles que entendem a importância de se preservar e valorizar todos os ecossistemas e todas as culturas, independentemente do lugar em que se desenvolvam. Mesmo porque, na condição de habitantes do planeta terra, devemos nos preocupar e zelar pelo todo, não obstante as fronteiras políticas estabelecidas, que são criadas muitas vezes de foma absolutamente reprovável. Enfim, a nossa casa é um único planeta e todo sacrifício para preservá-lo é perfeitamente justificável. O lema deverá ser: não cuidarei apenas do meu quintal, ou da minha rua, ou da minha cidade, ou do meu país, mas de tudo isso e da superfície planetária também, pois, como habitantes do planeta terra, temos direitos e deveres para com ele. Nesse sentido, deve nos ser facultado o direito de cuidar e estar em cada um dos seus diferentes recantos.

Tal entendimento já havia ficado claro para Kant lá no século XVIII quando, na fase avançada de sua maturidade, mudou um pouco o foco de suas reflexões, passando a se ocupar com questões referentes ao direito internacional. Com sua racionalidade prática, Kant ajuizou que seria necessário instituir mecanismos legais, ratificados e respeitados por todos os Estados para que fosse possível um convívio pacífico, não intervencionista entre eles. Para tanto, seria preciso um respeito e uma valorização maior das diferenças culturais e das autonomias nacionais. Realidade que apenas seria viável quando todas as divergências surgidas entres os países fossem resolvidas somente por via legal, através de uma espécie de tribunal internacional. Portanto, segundo Kant, a relação entre Ética e Política necessariamente deve ser estabelecida pelo Direito. É assim que Kant introduz diferentes conceitos de direito, sendo o que mais se aproxima das questões tratadas neste blog o "Direito de superfície": "ninguém tem mais direito do que outrem de estar em um lugar da Terra". Afinal, o planeta Terra é um patrimônio comum, que não deveria ter, por isso, prerrogativas patrimoniais particulares...

O intuito do blog será, então, procurar contribuir para a incorporação dos temas sócio-ambientais e identitário-culturais às nossas dinâmicas de vidas e às nossas discussões cotidianas. Nesse sentido, o blog também se transformará em um fórum de debates e ideias que girem em torno dos temas selecionados.

Sugestões de postagens serão prontamente aceitas e incorporadas ao blog, na medida em que tragam alguma contribuição relevante para ele, evidentemente. Dito isso, mãos à obra...

sábado, 15 de novembro de 2014

O Novo Código Florestal Brasileiro: suas tendências, suas implicações.

(texto de minha autoria)
O chamado Novo Código Florestal Brasileiro – aprovado pela Câmara dos Deputados em 26 de abril de 2012 – estabelece as condições e limites para uso do solo nas propriedades particulares, na medida em que institui que se deve preservar parte da vegetação nativa ou implementar reflorestamento em determinadas situações.
O Projeto de Lei nº 1.876/99, do qual resultou a revisão do Código que vigorava desde 15 de novembro de 1965, tramitou no Congresso Nacional por pelo menos dez anos até chegar ao seu texto final. A dificuldade em se estabelecer a Lei nº 12.651 que cria o Código se deu em virtude dos embates e oposições de dois dos principais grupos que procuraram exercer influência e pressão sobre os congressistas: os ambientalistas e os ruralistas. Até onde eu pude verificar, o Código acabou por desagradar a ambos. Aos ruralistas porque questionam os cálculos que estabelecem a chamada Reserva Legal que impossibilita um desmatamento total das matas nativas das diferentes regiões do país, mesmo estando localizadas em propriedades particulares. Além de dispor sobre Áreas de Preservação Permanente. O Código determina que se o imóvel rural estiver localizado na Amazônia deverá preservar 80% da mata nativa, no cerrado 35%, em áreas de campos 20 %, e demais regiões do país 20%. À época das discussões sobre este tema, o então deputado Aldo Rebele (relator do Código) disse, em um evento realizado na FIESP, que a maioria das propriedades rurais não tinham Reserva Legal nessas porcentagens e que, portanto, todos os produtores brasileiros estariam “operando quase 100% na ilegalidade”. O que para o deputado seria um absurdo e justificaria a revisão do Código Florestal vigente. Já a senadora Kátia Abreu, integrante da bancada ruralista, afirmava ser “radicalmente contra a Reserva Legal”, pois, segundo a senadora “só no Brasil há Reserva Legal”.
Os ruralistas questionam ainda a competência e a viabilidade de se deixar como alçada exclusiva da União a concessão de licenciamentos ambientais e a fiscalização de propriedades rurais. Querem transferir para os estados tais prerrogativas.
Já os ambientalistas sustentavam que o Código, tal como estava sendo configurado, flexibilizaria o uso e o desrespeito às Áreas de Preservação Permanente (APPs). Além de comprometer as faixas marginais de floresta junto aos cursos d’água.



Enfim, o Novo Código Florestal, a despeito de todas as polêmicas, ou principalmente devido a elas, chegou a um desfecho e foi submetido à apreciação da presidente Dilma Rousseff. A presidente, então, no uso de suas atribuições, vetou doze artigos do Código e propôs alterações em 32 dos 84 artigos.
Em entrevista ao programa Roda Viva da TV Cultura – veiculado nesta segunda feira (10/11) – o ministro da agricultura durante o governo Lula (2002-06) e atual coordenador de agronegócios da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Roberto Rodrigues disse, numa perspectiva mais geral, que “o Código Florestal não é bom, mas é o possível. Ninguém gostou, nem os agricultores, nem os ambientalistas. O que significa que ele é equilibrado”. Fazendo uma apreciação mais pessoal, o ex-ministro afirmou que “faltou ciência ao Código Florestal. Mais ciência. Tem que ser x por cento [de preservação da flora] por tais e tais razões. Faltaram razões científicas, técnicas, para acabar com a especulação, com denegrir as decisões tomadas. Então o Código ficou imperfeito por ter faltado ciência”.
Roberto Rodrigues chamou atenção ainda para o fato de que haveria coisas “formidáveis” no código. Entre elas citou o Cadastro Ambiental Rural (CAR). Contestando outra crítica que se faz ao Código Rodrigues foi tachativo ao dizer que não houve anistias no Código. Desse modo “porque quem estava errado vai pagar [multas por devastação ilegal das matas] ou vai recompor a floresta dele’. Finalmente, para o ex-ministro, o Código Florestal legaliza o setor do agronegócio brasileiro “de maneira formidável” e “abre possibilidades de competitividade sustentável”.
Durante a tramitação do Código Florestal no Congresso Nacional o geógrafo, e então professor emérito da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da Universidade de São Paulo (USP) Aziz Ab’Saber enviou um texto aos congressistas no qual expunha considerações sobre como, a seu ver, deveriam ser fundamentados, de forma bioética, os preceitos do Código. Nesse texto o professor já identificava a deficiência científica supracitada pelo ex-ministro da agricultura Roberto Rodrigues. No modo de entender do geógrafo, tal deficiência advinha da falta de capacitação adequada daqueles que intentavam, no Congresso, fazer uma revisão do Código Florestal em vigor: Em face do gigantismo do território e da situação real em que se encontram os seus macro biomas – Amazônia Brasileira, Brasil Tropical Atlântico, Cerrados do Brasil Central, Planalto das Araucárias, e Pradarias Mistas do Brasil Subtropical – e de seus numerosos mini-biomas, faixas de transição e relictos de ecossistemas, qualquer tentativa de mudança no “Código Florestal” tem que ser conduzido por pessoas competentes e bioeticamente sensíveis. Pressionar por uma liberação ampla dos processos de desmatamento significa desconhecer a progressividade de cenários bióticos, a diferentes espaços de tempo futuro. Favorecendo de modo simplório e ignorante os desejos patrimoniais de classes sociais que só pensam em seus interesses pessoais, no contexto de um país dotado de grandes desigualdades sociais. Cidadãos de classe social privilegiada, que nada entendem de previsão de impactos. Não tem qualquer ética com a natureza. Não buscam encontrar modelos tecnico-cientificos adequados para a recuperação de áreas degradadas, seja na Amazônia, , seja no Brasil Tropical Atlântico, ou alhures. Pessoas para as quais exigir a adoção de atividades agrárias “ecologicamente auto-sustentadas” é uma mania de cientistas irrealistas.
Aziz Ab’Saber diz ter ficado indignado com a resposta que recebeu do Congresso. Tal resposta afirmava que o professor tinha “uma ideia boa, mas complexa e inoportuna’.
O professor cita como sendo uma das tendências mais equivocadas dos encaminhamentos no Congresso para a criação do novo Código – que para ele seria “a favor de classes sociais privilegiadas” –  a tentativa de estadualizar competências para tratar de questões de desmatamento e preservação do biomas nacionais, pois: exigem ações conjuntas dos órgãos federais específicos, em conjunto com órgãos estaduais similares, uma Policia Federal rural, e o Exercito Brasileiro. Tudo conectado ainda com autoridades municipais, que tem muito a aprender com um Código novo que envolve todos os macro-biomas do pais, e os mini-biomas que os pontilham, com especial atenção para as faixas litorâneas, faixas de contato entre as áreas nucleares de cada domínio morfoclimatico e fitogeográfico do território. Para pessoas inteligentes, capazes de prever impactos, a diferentes tempos do futuro, fica claro que ao invés da “estadualização”, é absolutamente necessário focar para o zoneamento físico e ecológico de todos os domínios de natureza dos pais. A saber, as duas principais faixas de Florestas Tropicais Brasileiras: a zonal amazônica e a azonal das matas atlânticas o domínio dos cerrados, cerradoes e campestres: a complexa região semi-árida dos sertões nordestinos: os planaltos de araucárias e as pradarias mistas do Rio Grande do Sul, alem de nosso litoral e o Pantanal Mato-grossense.
Diante de tantos problemas verificados, o professor acaba por questionar a competência do próprio relator do Código para tratar do tema. Segundo Aziz, o deputado Aldo Rebelo, relator do Código, seria um “neófito em matéria de questões ecológicas” e desconhecedor da realidade rural brasileira. Para fundamentar suas críticas o geógrafo traça um quadro da situação que ele próprio verificou na Amazônia, onde: predomina um verdadeiro exército paralelo de fazendeiros que em sua área de atuação tem mais força do que governadores e prefeitos. O que se viu em Marabá, com a passagem das tropas de fazendeiros, passando pela Avenida da Transamazônica, deveria ser conhecido pelos congressistas de Brasília, e diferentes membros do executivo. De cada uma das fazendas regionais passava um grupo de cinquenta a sessenta camaradas, tendo a frente em cavalos nobres, o dono da fazenda e sua esposa, e os filhos em cavalos lindos. E os grupos iam passando separados entre si, por alguns minutos. E , alguém a pé, como se fosse um comandante, controlava a passagem da cavalgada dos fazendeiros. Ninguém da boa e importante cidade de Marabá saiu para observar a coluna amedrontadora dos fazendeiros. Somente dois bicicletistas meninos, deixaram as bicicletas na beira da calçada olhando silentes a passagem das tropas. Nenhum jornal do Pará, ou alhures, noticiou a ocorrência amedrontadora. 
Aldo Rebelo, por sua vez, sempre procurou contemporizar o quadro drástico de desmatamento verificado por todo o país. Numa tentativa de justificar a ampliação das áreas produtivas, com o consequente desmatamento, defendia, numa interpretação do modo como se entende a preservação de determinada vegetação nativa, a junção entre os conceitos de Áreas de Preservação Permanente e Reserva Legal. De modo que, se em uma dada propriedade houvesse Área de Preservação Permanente, tal propriedade ficaria desobrigada de respeitar o percentual total da Reserva Legal. Essa postura, quando generalizada, torna-se um evidente absurdo. Para um imóvel rural localizado, por exemplo, na Amazônia, se seu proprietário preservasse a faixa de floresta que segue o curso de um rio ele não precisaria respeitar os 80 % de preservação estabelecidos pelo Código e sua propriedade ficaria praticamente desmatada, causando um impacto ambiental incalculável.  Ocorre que o então deputado inverte a ótica da questão e a interpreta sob o viés das restrições de plantio do produtor. Restrições que, para ele, “tornam a agricultura inviável no Brasil”. Aí estando, no seu modo de entender, a necessidade de se rever e se atualizar o Código Florestal. Ou seja, para Aldo Rebelo o Código é que deveria se adequar aos descumprimentos da legislação vigente praticados pelos ruralistas , e não o contrário, isto é, aperfeiçoar os mecanismos legais e de fiscalização de modo a forçá-los a cumprir a Lei Ambiental.
O Código acabou admitindo, no seu Artigo 15, o cômputo das Áreas de Preservação Permanente no cálculo do percentual da Reserva Legal. Assim, a área de vegetação nativa preservada poderá ser reduzida. Já o Parágrafo 12 do Artigo 15 possibilita que um imóvel rural reduza a sua Reserva Legal em até 50% com a condição de que o Estado, no qual ele se localiza, tiver um mínimo de 65% de seu território protegido. Isso pode acabar dando margem a desmatamentos indevidos. No meu modo de entender o Artigo 68 é um completo absurdo, pois anistia os proprietários que promoveram desmatamento  da vegetação nativa respeitando a legislação vigente à época. Ou seja, eles estão dispensados de reflorestar suas propriedades para se adequarem ao Código atual. De modo que se a intenção do Código fosse preservar, ele não teria dado margem a descumprimentos da Lei atual e admitido configurações tão díspares das propriedades rurais. A Lei ou é universal ou perde sua força e cria mais confusão do que elucida. Em outras palavras, o Código ficou com aparência de um mosaico indefinido.
O então deputado, nas entrevistas que concedia, mostrava-se mais preocupado com a expansão das fronteiras agrícolas brasileiras e com a fome no mundo do que em se decidir se seria a agricultura ou a indústria a causadora de mais desequilíbrios ambientais. Segundo Rebelo, o Brasil não poderia ser responsável pelo ônus da devastação ambiental no planeta, já que a Europa teria apenas 3% de seu território coberto de vegetação nativa, enquanto o Brasil teria 60%.
Para finalizar, é bom lembrar que Aldo Rebelo é um polivalente. De ministro-chefe da Secretaria de Coordenação Política e Relações Institucionais  do governo Lula passou à presidência da Câmara dos Deputados. Em seguida foi relator do Novo Código Florestal Brasileiro e ainda teve fôlego para engatar a chefia do Ministério dos Esportes do primeiro governo da presidente Dilma. Na qualidade de ministro dos esportes aparecia sorridente vestido com as cores da bandeira brasileira. Já não ostentava a aparência sisuda e circunspeta dos tempos da relatoria do Código e dos embates com os ambientalistas. Resta saber se fez tudo isso por meritocracia ou por conveniências políticas de ocasião.

Dada a importância do Novo Código Florestal para a prática sustentável do agronegócio brasileiro e para a preservação e valorização dos diferentes ecossistemas e biomas nacionais, com os consequentes reflexos no equilíbrio do planeta Terra como um todo, torna-se igualmente importante sua valorização e cumprimento de seus preceitos. Por isso, resolvi colocá-lo no blog para apreciação e debate.


































































Nenhum comentário:

Postar um comentário